1. O estudo Net Zero Readiness Report 2023 analisa as medidas tomadas por 24 países, bem como por setores económicos chave, para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa e também discute o seu grau de preparação e capacidade para atingir emissões líquidas nulas destes gases até 2050. De uma forma geral, o cenário é positivo ou ainda se percebe um atraso nesta transição?

Apesar de muitos países terem realizado avanços relevantes, em particular na Europa, que tem claramente liderado no combate às alterações climáticas, seguindo uma agenda regulatória consistente e focada em influenciar a descarbonização das suas economias, o cenário global não é muito positivo e é evidente um atraso da transição energética, como aliás fica bem patente na falta de consenso que se tem verificado nas sucessivas cimeiras climáticas.

As perspetivas de recuperação deste atraso não são muito otimistas no atual contexto mundial, fortemente marcado pelos efeitos de duas guerras, prevendo-se uma crescente dificuldade em manter o foco no combate às alterações climáticas e em compatibilizar os exigentes investimentos de descarbonização com outras necessidades, como por exemplo os apoios públicos para compensar os efeitos dos aumentos dos custos com energia, da inflação e do aumento das taxas de juro, bem como com necessidades de aumentar investimentos associados ao reforço da segurança nacional.

2. Dentro dos países analisados, há uns que se destacam pela implementação de medidas que aceleram esta transição energética face a outros. Mas o que torna uns países tão atrasados neste processo face a outros?

Destacaria duas naturezas de razões. Por um lado, existe um conjunto alargado de países com baixos níveis de desenvolvimento, com fortes constrangimentos financeiros, que enfrentam ainda grandes desafios para satisfazer necessidades básicas das populações, para os quais obviamente as alterações climáticas não são ainda uma prioridade.

Por outro lado, temos países desenvolvidos que estão mais atrasados por falta de foco no combate aos efeitos das alterações climáticas, que não têm colocado a transição energética no topo das prioridades políticas.  

3. Como facilitar o acesso a soluções nos países que ainda não as têm?

O sucesso da transição energética nos países menos desenvolvidos terá de passar obrigatoriamente por estratégias de colaboração internacional e de financiamento das medidas de combate às alterações climáticas.

De facto, uma das grandes decisões da COP28 foi o lançamento de um fundo de “perdas e danos” para ajudar os países mais vulneráveis às alterações climáticas, com os países do norte e do sul a chegarem a acordo sobre as regras de funcionamento deste fundo, que prevê um financiamento de 100 mil milhões de dólares por ano, com início oficial previsto para 2024.

4. A primeira vez que a KPMG realizou este estudo foi em 2021, pouco antes da COP26. Quais as principais diferenças entre este estudo e o atual?

Destacaria duas naturezas de razões. Por um lado, existe um conjunto alargado de países com baixos níveis de desenvolvimento, com fortes constrangimentos financeiros, que enfrentam ainda grandes desafios para satisfazer necessidades básicas das populações, para os quais obviamente as alterações climáticas não são ainda uma prioridade.

Por outro lado, temos países desenvolvidos que estão mais atrasados por falta de foco no combate aos efeitos das alterações climáticas, que não têm colocado a transição energética no topo das prioridades políticas.  

5. Considera que o objetivo de emissões líquidas nulas até 2050 vai ser realmente cumprido?

O objetivo de emissões líquidas nulas até 2050 será certamente atingido por muitos países, nomeadamente na Europa, mas parece-me muito provável que muitos países menos desenvolvidos não venham a conseguir atingir esse objetivo em 2050.

Por outro lado, países com um grande impacto nas emissões globais – como os Estados Unidos, a China e a Índia – têm ainda um longo caminho pela frente para conseguirem atingir este objetivo. O sucesso destes países determinará em grande medida o sucesso global.

Entrevista a Pedro Cruz, Partner de ESG, a 23 de fevereiro no ECO.